Fonte: Kim Seong-Eun e Oh Seung-Min (2009)
A imagem acima, do livro Minha Mão é uma Régua, ilustra o tema que vamos tratar neste post : a representação do espaço, unidade de medidas não convencionais, redução, ampliação e a ideia de escala cartográfica.
A escala cartográfica é um conceito complexo para as crianças nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. De acordo com Lesann (2009, p. 32) o entendimento da escala envolve a compreensão de "abrangência de um fenômeno no espaço geográfico" e a "percepção da dimensão quantificada" desse espaço. O conceito, de modo geral, pode ser definido como "a diferença proporcional entre a medida das distâncias do espaço real e a medida das distâncias no mapa" (PASSINI, 2012, p. 131). De modo bastante simplificado, refere-se a quantidade de vezes que um determinado espaço geográfico foi reduzido, de modo proporcional, para ser representado em um desenho, mapa, carta ou planta.
É possível fazer com as crianças um trabalho com atividades práticas que favoreça o entendimento posterior do que venha a ser o conceito de escala e o aprendizado do seu cálculo. Mais do que trabalhar o conceito (que é algo abstrato), é importante oportunizar atividades tendo como foco a escala perceptiva, ou seja, não quantificada (sem o uso de fórmulas matemáticas). Isso envolve, a princípio, observar e identificar as diferenças de tamanho dos objetos sem a mudança da forma, a possibilidade de representar objetos em tamanhos diferentes e de modo proporcional (por exemplo: atividades de ampliação e redução na malha quadriculada). Essas atividades e muitas outras podem contribuir para que a criança desenvolva a noção de relação entre os objetos, dimensão, proporção e escala (LESSAN, 2009).
No post de hoje iremos apresentar uma atividade de representação da sala de aula usando a malha quadriculada e utilizando os passos como instrumento de medida. Essa aula foi realizada no 4º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública, ministrada pela professora Renata Monteiro.
Uma prosa sobre a aula
No início da aula, foi apresentada uma imagem em tamanhos diferentes, partiu-se da problematização de como podemos aumentar ou diminuir uma figura, mas manter as medidas proporcionais ao tamanho original. Os alunos levantaram suas hipóteses e na sequência foram entregues para as crianças diferentes imagens do jogo Mario Bross, do qual eles possuíam grande afinidade, e foi proposto o desafio de conseguirem aumentar e diminuir as imagens apresentadas utilizando a malha quadriculada.
Após a atividade de ampliação e redução dos desenhos, foi solicitado para os alunos observarem atentamente a sala de aula, identificando os móveis presentes e a sua disposição e localização na sala. Conforme os alunos foram identificando os móveis, a professora questionava sobre qual figura geométrica continha na superfície desses objetos (retângulo, quadrado, círculo). Exemplo: a carteira e a mesa (retângulo), a lixeira (círculo).
As crianças foram divididas em duplas, um dos alunos seria o "mapeador" e o outro o responsável pela "medição". No entanto, as medidas teria como instrumento os pés. Ficou determinado que cada passo do aluno (responsável pela medição) corresponderia a duas quadriculas da malha. Antes de iniciar a atividade a professora fez alguns exemplos práticos.
O aluno "medidor" teve como responsabilidade medir com os pés o comprimento da sala de aula e seus móveis, além de informar o "mapeador" para que este fosse construindo a planta da sala de aula. Exemplo: o comprimento da parede frontal da sala é de 15 passos e isso equivale a 30 quadrículas. Durante a atividade a professora foi realizando a mediação para que os alunos pudessem concluir a tarefa.
Essa atividade possibilita que os alunos façam a representação da sala de aula de modo proporcional. Após o término dessa atividade, a professora lançou algumas situações-problema fazendo os seguintes questionamentos: se as pessoas entenderiam aquele desenho; o que poderia ser incluído para que as outras pessoas pudessem identificar os móveis da sala etc. Após o diálogo, os alunos inseriram a legenda.
Nesse trabalho a dupla revelou uma ótima percepção, distribuição espacial e entendimento da proposta, na qual cada passo era equivalente a duas quadrículas. Fez a legenda. Desenhou a porta em outra perspectiva, tal fato pode ser levantado como uma situação problema. Exemplo: Se a sala de aula não tivesse teto e nós voássemos sobre ela, nós enxergaríamos a porta dessa forma?
Fonte: próprio da autora.
Nessa imagem os alunos fizeram o desenho com uma boa percepção visual e espacialidade. No entanto, a dupla utilizou outra medida, ou seja, cada passo equivale a uma quadrícula. Uma outra situação problema que pode ser explorada: Por qual motivo essa representação ficou menor que as demais.
Nesse caso, a dupla colocou o nome nos objetos representados, mas não foi no formato de legenda padrão.
Fonte: próprio da autora.
Terminado essa etapa outro desafio foi lançado: quantas vezes a sala de aula foi "diminuída" para poder ser desenhada no papel quadriculado. As crianças fizeram as suas estimativas. A professora sugeriu o uso do barbante para medir uma das paredes da sala. Com a ajuda dos alunos o barbante foi esticado de uma extremidade a outra da parede da sala de aula. O barbante foi cortado na medida da parede e foi feita uma atividade de redução com o barbante. A professora pegou uma das representações dos alunos e, junto com eles, identificou qual a parede que foi medida e a sua representação no desenho. Exemplo: mediu-se a parede onde estava o quadro negro e os alunos tiveram que identificar onde estava essa parede no seu desenho. Feito isso, utilizou-se do barbante para fazer a redução.
Na sala de aula foi utilizado o barbante, mas para aparecer na imagem usamos uma lã vermelha. Na atividade, a professora foi contando junto com os alunos quantas vezes foi possível dividir o barbante (com a metragem da parede da sala) para que ele ficasse do tamanho da mesma parede do desenho. Foi utilizada a medida da distância real e a medida da distância do desenho, medidas necessárias para o cálculo da escala cartográfica.
Fonte: próprio da autora.
Embora a professora não tenha dado ênfase ao conceito formal de escala, a ideia de redução proporcional e a escala perceptiva foram trabalhadas e vivenciadas pelos estudantes. Algumas duplas anotaram a informação (escala) em seus desenhos.
Fonte: próprio da autora.
Nesse exemplo acima, a dupla apresentou dificuldades em distribuir as carteiras, sobrando um espaço vazio enorme. É importante, por meio de uma conversa, fazer a dupla observar a sala de aula para verificar se realmente existe aquele espaço e questionar porque aconteceu isso. Nesse trabalho o dupla colocou a "escala", o objetivo não foi de representá-la de forma correta (1:30), mas começar a entender a ideia de escala.
A análise dos desenhos é uma etapa importante para o professor, pois é direcionadora de novas atividades. É possível perceber quais são as facilidades e dificuldades de representação. A partir disso, oportunizar para as crianças outras atividades que favoreçam a percepção do espaço, dos objetos que o compõem, a sua organização e a forma de representá-los de maneira proporcional respeitando a distribuição real dos elementos.
Com um único professor na sala de aula, nem sempre é possível fazer todas as mediações necessárias para que os alunos concluam com êxito. Mas, ao expor os trabalhos é possível fazer várias problematizações: Por quê os desenhos ficaram em tamanhos um pouco diferentes? A distribuição dos móveis e os espaços entre eles estão "iguais" a sala de aula? O que é possível fazer para que o desenho se torne uma representação mais "igual" a sala de aula? E muitos outros desafios podem ser lançados e novos desenhos podem e devem ser feitos para ajudar os alunos a perceberem melhor o espaço e a sua representação, sempre de forma respeitosa e amorosa com o trabalho da criança. A ideia não é apontar erros, mas provocar reflexões e desenvolver um olhar mais "apurado".
De olho na BNCC
Na unidade temática "Formas de representação e pensamento espacial" pretende-se que, gradativamente, o aluno amplie seu entendimento e sua capacidade de interpretação de mapas e de outras formas de representação do espaço geográfico. É consenso entre os estudiosos da área que "para ser um bom leitor de mapas é preciso saber fazê-lo". Isso se faz de forma progressiva, isto é, do simples para o complexo, do concreto para o abstrato e ao longo da escolaridade.
Embora seja no 3º ano que aparece o objeto do conhecimento "representações cartográficas" e a habilidade (EF03GE07) que refere-se a " reconhecer e elaborar legendas com símbolos e diversos tipos de representações em diferentes escalas cartográficas", essa atividade foi realizada no 4º ano, pois ela possui um nível de dificuldade maior.
Esticando a conversa ...
Segue a indicação de alguns livros que podem contribuir para o entendimento de escala e de atividades para crianças nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.
PASSINI, Elza Yasuko. Alfabetização cartográfica e a aprendizagem de geografia. São Paulo: Cortez, 2012.
LESSAN, Janine. Geografia no Ensino Fundamental I. Belo Horizonte, MG: Argumentum, 2009.
VIANNA, Pedro Costa Guedes. Escala: instrumento para a compreensão do mapa. IN: BUITONI, Marísia Margarida Santiago (Coord.). Geografia: ensino fundamental. Coleção Explorando o Ensino. V. 22. Brasília: Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica, 2010, p. 137-152. (disponível on-line)
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